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sexta-feira, 18 de janeiro de 2019

Encontro #4

Em nosso quarto encontro (terça, 15 de janeiro de 2019, de 09h/13h no CCBB), estivemos apenas eu e Márcio.  Levei uma nova versão sobre o que é, quem é YELLOW BASTARD. Lemos e conversamos muito. Por se tratar de uma criação em criação, posso afirmar que tudo ainda está em aberto e que, pouco a pouco, encontramos os sentidos que se tornam mais sensíveis a nós e, por extensão - imaginamos -, ao nosso espectador. Destaco alguns aspectos determinantes que foram conversados:

- a questão das idades em Marte, quando um ser gera outro, quantos anos geralmente dura uma existência marciana etc.;

- percorremos a vida de Yellow desde sua infância: foi amamentado (e isso contribuiu para a coloração de sua pele ir ficando branca no correr dos anos); não viu muitos espelhos (logo, não tomou compreensão de si e muito menos investiu demasiada importância na noção de indivíduo); suas festas de aniversário, feitas pela mãe terráquea, sempre foram muito amarelas, dando a ele alguma sensação de pertencimento ao mundo; na adolescência, respondia aos bullyings com leveza e ingenuidade e, como que por distração, sobreviveu a todos eles; adulto, tornou-se advogado de defesa, especializado em causas relacionadas aos direitos humanos; após sua formação, foi compreendendo ser preciso atuar num drama social, cimentando um pouco a sua bondade para dar lugar a um homem bem-sucedido e capaz de sobreviver na selva da cidade;

- o aspecto crístico (de Cristo) é o seguinte: sua bondade, nutrida pela mãe terráquea, sempre foi rebatida (fosse nos bullyings vividos na adolescência ou nas dificuldades da vida adulta e profissional), porém, Yellow sempre respondeu a tudo de modo a se desculpar, nunca sofrendo os problemas, mas sempre tentando compreende-los a fim de melhorar a si mesmo e a situação. Porém, em analogia ao percurso de Jesus, podemos pensar: sendo esse ser libertário, confiante e praticante do amor independente das dificuldades, Yellow seria prontamente crucificado, seria morto. A questão então é: ele, progressivamente, vai cimentando essa bondade em si mesmo e se tornando um homem duro, não propriamente violento ou rude, mas com um brilho mais apagado. Quando tudo é revirado e ele volta a Marte, aí sim este homem escondido dentre dele, sua versão crística, finalmente precisa aparecer, pois em Marte a violência é muito maior e o amor, por extensão, também precisa ser muito mais destemido; para concluir seu percurso, poderíamos dizer que o Yellow Bastard que se faz surgir na crise de meia idade desse "homem" nada mais é do que o retorno à própria infância;

- três questões fazem o amarelo de sua pele (re)aparecer: 1) a morte da mãe terráquea; 2) a revelação dita por ela, antes de morrer, de que ele não veio dela, de que ele não veio branco; e 3) a conexão abrupta e inexplicável com algo muito distante e intenso (o ser que o gerou e que está, a sua espera, em Marte). Pode-se dizer que a pele amarelar nada mais é do que um intenso processo de alta, altíssima exposição;

- três lutas se abrem a partir dessa virada em sua vida, em sua existência, quase ao completar cinquenta anos: 1) a luta contra a situação de ser alguém que subitamente se tornou amarelo; 2) a luta para compreender, para entender toda essa situação; e 3) a luta com essa espécie de chamado que há fora de si, um chamado de Marte (ele ainda não compreende);

- sobre Marte ser outro planeta a partir da afirmação terráquea: "se esse é o mundo que temos, eu devo então ter nascido noutro planeta". Em outras palavras: Marte, em nossa criação, é um planeta despótico (tal como a Terra está se tornando) e a Terra, onde há o amor, é uma chave capaz de modificar as dinâmicas em Marte.

Um dia antes desse encontro, enviei para uma amiga advogada (Tatiana Alvim) um áudio, pedindo a ela que me dissesse um pouco sobre a sua vida, sua rotina como advogada. Neste quarto encontro, eu e Márcio ouvimos aos seus áudios e vários aspectos sobre ser advogado nos chamaram a atenção:

- a imposição de uma indumentária aos advogados;
- algumas tarefas extremamente burocráticas como "alimentar o sistema";
- tarefas "interessantes" como pegar uma demanda, estudar a causa, encontrar brechas na lei para a defesa de um cliente, enfim, inventar uma história para realizar a defesa (algo, a propósito, muito presente em qualquer filme com advogados e defesas diversas);
- NESSE PONTO, INVESTINDO NAS ANALOGIAS QUE VENHO PERSEGUINDO, DESTACO >>> o advogado é também um contador de histórias <<< ELE ENTENDE A SITUAÇÃO, MONTA NO PAPEL A SUA NARRATIVA E FAZ A SUA DEFESA, A SUA PERFORMANCE;
- também sofre o drama da consciência, tendo que ser (defender) aquilo que você não é (não acredita);
- a boa sensação de defender algo que o seu senso de justiça defenderia;
- e as relações de trabalho, os encontros e amizades que acabam sendo criados (minha amiga Tat descreve um gesto feito por uma funcionária com a qual ela não se dava muito bem, um gesto de profundo cuidado e bondade).

Por fim, compartilho a seguir algumas imagens de uma história em quadrinhos que o Márcio levou como referência, ASTERIOS POLYP, de David Mazzucchelli:




quinta-feira, 7 de dezembro de 2017

Qual diferença ele possui?



Sigo me encontrando com Márcio, agora com mais frequência. Foram dois encontros nesse mês de dezembro e pretendemos seguir até o fim do ano. Em janeiro, é previsto começarmos algum tipo de prática envolvendo ações na cidade. Não sei ainda. O que estamos tramando? É tanto. A certeza é apenas uma: quanto mais nos encontramos presencialmente mais desdobramos essa criação. E se eu escrevo agora, neste blog, é mais para frisar o que já ficou marcado em mim.

Hoje íamos ler alguns trechos de textos e acabamos não fazendo nada disso. Ficamos um bom tempo conversando sobre alguns pontos do percurso desse ser. Contei ao Márcio que sigo escrevendo uma cronologia de fatos vividos por nosso personagem (desde 1974 até 2000 e vinte e poucos). Dentre esses fatos, para além de detalhes específicos da vida da personagem (o dia em que passou pela situação tal), encontram-se também marcos da história da humanidade, porém, nem sempre fatos emblemáticos, às vezes apenas situações como o dia em que um jovem profanou uma imagem de Nossa Senhora da Aparecida no Brasil.

Quanto mais tornamos específico o caminho do personagem, quanto mais os detalhes, mais conseguimos vislumbrar alguma existência do mesmo.

Em nosso encontro, cheguei munido do livro HIPERESPAÇO de Michio Kaku. Foi o Gunnar Borges que me emprestou esse livro. Na época, faz uns meses, eu estava querendo entender mais o assunto das dimensões de espaço e tempo. Não entendo nada, mas sigo investigando. Ler teorias da física complexifica ainda mais a coisa e parece tornar a poesia ainda mais possível. Uma contradição, talvez, mas sigo mexendo com tudo.

O interesse nas dimensões de espaço e tempo veio quando eu comecei a perguntar o seguinte: qual é a diferença que esse ser extraterrestre possui em relação aos humanos? A primeira delas é evidente, diz respeito à sua cor amarela. Isso o torna diferente, porém, é uma diferença óbvia, visível, étnica mesmo. Nada estranho ao nosso mundo.

Por que, eu poderia perguntar, por que a necessidade de uma diferença ainda mais marcada? Ora, se YELLOW BASTARD nasce como uma investigação da intolerância humana, eu preciso oferecer contraponto. Veja: não para fazer mero drama, mas para - justamente - operar dialeticamente, oferecer contraponto visando uma síntese mais complexa: tese, antítese, síntese. Talvez.

De qualquer forma, para além da pele amarela, há algo nesse ser que extrapola a condição humana, que a assusta justamente por ser diferente. Há um saber, uma consciência sensível, uma consistência muito afetiva, estrangeira (que lembra Jesus Cristo) e que diz respeito unicamente ao modo pelo qual esse ser sente. Não é uma questão cultural, de criação, por exemplo. É uma questão fisiológica, interna, do corpo. Diz respeito a uma sensibilidade (uma filosofia prática).

Sobre essa capacidade/habilidade de YELLOW, eu poderia arriscar algumas hipóteses: quando informo que há outra sensibilidade, retomo a discussão sobre as dimensões. Eu acho que esse ser é menos eu e mais o outro. Ele é mais passagem, mais caminho do que ser centrado e individuado. Fiquei pensando qual diferença seria de fato ameaçadora à raça humana? Ora, uma existência que não se acha o centro do universo seria uma ameaça ao homem. Uma existência que não vê no "eu" a salvação do planeta, sem dúvida, é uma grande ameaça (sobretudo porque tal existência é praticamente uma negação muito contundente de tudo o que nos acostumamos a ser e a buscar).

A sensibilidade de YELLOW é a de ser passagem, é a de ser caminho, para o outro, para outras narrativas; narrativas da alteridade. A sensibilidade dele - que é quase um super poder - é para o fora, não para si, não para o dentro apenas. É, desde já, uma crítica ao antropocentrismo. Ele tem a habilidade de ser frequentado pelas coisas mais do que apenas ser alguém. Ele, nesse sentido, vive a vida em tempo espiralado, em simultaneidade, junto ao eterno retorno.

O que já foi e o que virá coexistem nesse instante presente em que se é e no qual se está. A guerra do passado vive agora no futuro que nem veio, mas que já está aqui. YELLOW BASTARD zomba das cronologias e concatenações e causalidades todas. YELLOW tem desinteresse por arranjos lógicos que, talvez, predeterminem o todo.

Para fazer nascer essa criação, é como se eu tivesse que me pergunta o que há no ser humano que eu precise exterminar mesmo.